sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Quelle chance!

Três meses atrás quando resolvi que depois de ficar alguns dias em Salamanca eu iria para Paris fazer um curso na Ecole Lenôtre, eu decidi comprar um ingresso para ver a première da ópera Mme Butterfly na Ópera de la Bastille no dia 29 de Janeiro. Qual não foi minha surpresa quando no dia da apresentação recebi um telefonema, já em Paris, para me informar que o espetáculo tinha sido anulado por razão da greve geral que acontecia no país. Vale dizer que havia um milhão de pessoas, sério, nas imediações da Place de La Bastille empunhando milhares de cartazes com palavras de ordem contra a política econômica do Sarkozy, uma multidão marchando e gritando. Longe de mim não ser solidária às reivindicações dos franceses mas, cá entre nós, sorte que estava bem longe de lá.
Bem e aí? Resolvi que isto não iria estragar minha noite! Fui jantar no Michel Rostang.
Assim que a porta do restaurante se fechou atrás de mim e uma gentil funcionária me ajudava a livrar-me do “casacoluvascachecol”, já pude sentir o forte aroma de trufas que inundava todo o ambiente. Que delícia! Estava no lugar certo. A ambientação é muito elegante com coleção de figuras de Robj, vasos Gallé. Fui encaminhada para uma mesa de canto na sala que fica em frente à cozinha envidraçada. De lá eu acompanharia o serviço da noite. A cesta de trufas foi-me apresentada e o sommelier, pacientemente, ajudou-me a escolher a melhor meia garrafa para o Tagliarini aux truffes et escalope de fois gras de canard poêlée que escolhi: um branco Chassagne-Montrachet 2004, Domaine Bachelet-Ramonet.
Na mesa à minha esquerda um escritor quase famoso, cabelos pretos encaracolados e blazer azul marinho displicentemente jogado sobre uma camisa branca como só os franceses sabem fazer, era o centro das atenções de outras cinco pessoas: uma ruiva de cabelos curtos e gestos largos, uma loira delicada de fala baixa e três homens com cara que gostariam de estar em qualquer lugar, menos lá. Tudo que o escritor falava era motivo de exclamações e risos e qualquer gesto seu razão para espanto. Pura bajulação!
À minha direita um senhor inglês de terno tipo “sou importante” tentava, em vão, entre um gole e outro de uma taça de Champagne, se concentrar em um relatório enfadonho qualquer. Já na mesa bem à minha frente um grupo de quatro pessoas, estes sim, se divertindo, pediram um Canard à La presse.
A atendente oriental responsável por aquela sala flutuava pelo ambiente incansavelmente, mimando a todos com deliciosos amuse bouche: bolinhos de pé de porco com chutney de figos, Ravióli frito de lagostim, mini ramequim de pato com morriles...
Meu prato chegou: esqueçam tudo que já comi! E só o que posso dizer sobre a perfeição de meu prato.
Em determinado momento uma euforia tomou conta dos atendentes, era como se aspas tivessem sido colocadas no ambiente: todos se juntaram para servir o canard à la presse para os felizardos à minha frente. A sala toda parou para presenciar aquele momento.
Mais tarde, tive que dispensar a sobremesa, mas com o café, zilhões de docinhos perfeitos foram colocados à minha frente. Pedi o taxi. Na saída recebi um mundo de gentilezas e junto com um “quando estiver na cidade lembre-se de nós” foi-me entregue um brioche de frutas vermelhas para comer no café da manhã do dia seguinte.
O frio era intenso e a noite era clara. O movimento na rua já era pouco, o carro como que deslizava pelas ruas. Para minha surpresa tocava no rádio do taxi jazz de qualidade. Vi no dial: rádio África 1.
Quando o carro passou pela ponte Alexandre III vi a lua quase cheia no céu e pensei:
Perdi um espetáculo maravilho, é certo! Mas o espetáculo que vi, presenciei e do qual participei foi sem sombra de dúvidas de primeira qualidade!



Michel Rostang
20, Rue Rannequin fone 1 47634077
www.michelrostang.com